SEXO SOBRE RODAS
Fabiano Puhlmann defende que portadores de deficiência rompam preconceitos para melhorar a vida sexual. Deficiente tem que reaprender a seduzir, diz o psicólogo.
Um simples mergulho numa piscina e a vida de Fabiano Puhlmann, 40, mudou completamente. Quando tinha 18 anos, o psicólogo quebrou o pescoço, o que o tornou paraplégico. A sua experiência serviu-lhe de estímulo para ajudar outras pessoas deficientes a encarar sua condição e a não se intimidar com ela. Até mesmo quando o assunto é sexo.
Puhlmann, que é autor do livro "A Revolução Sexual sobre Rodas" (Ed. Nome da Rosa), conta ser freqüente as pessoas verem um deficiente com uma mulher bonita e logo pensarem: "Ou é compaixão ou ele é rico. Não se imagina que eles [os deficientes] tenham uma vida sexual legal".
Membro da Sociedade Brasileira de Sexologia Humana, Puhlmann diz, com jeito alegre e sorriso tranqüilo, que o deficiente físico precisa romper, antes de tu tudo, com o próprio preconceito e redescobrir que é capaz de seduzir."Se o deficiente acha que não tem nenhum poder de sedução ou que a cadeira de rodas é um peso enorme, as pessoas sempre vão vê-lo no papel de amigo. Aí fica difícil para a pessoa que não tem deficiência se envolver."
Trechos da entrevista concedida pelo psicólogo à Folha:
Fabiano Puhlmann - Quando você fica deficiente é [essa imagem]. Eu sou deficiente há mais de 20 anos. Como eu já fui andante, sei bem o que o "normal" pensa. O deficiente é olhado de maneira diferente, como alguém que precisa de cuidados. Um homem doente com uma mulher bonita. "O que ela está fazendo com ele?
Folha - Qual é a auto-imagem de uma pessoa deficiente? Puhlmann - Quando alguém adquire uma deficiência, está com o imaginário de uma pessoa que não é deficiente. A pessoa não se acha deficiente, acha que aquilo vai passar. A pessoa mesmo tem preconceito. Quando se rompe essa barreira, se consegue ensinar o outro. Ensinar a si próprio primeiro e depois ensinar o outro. Mas, logo num primeiro momento, essa relação é carregada de preconceito. A sociedade trouxe isso para ela.
Folha - Como o deficiente lida com isso? Puhlmann - O deficiente aprende em todas as situações que vive que ele tem de ensinar [aos outros]. À medida que ele conversa, as pessoas vão percebendo que não há nada de mais, que podem falar com ele, podem até brincar com o fato da deficiência, se a pessoa dá esse espaço. A dificuldade está em entender que isso pode acontecer com qualquer pessoa. Sempre fica a pergunta: como foi lhe acontecer isso? Uma cliente minha, deficiente desde pequena, estava grávida. Ela pegou um táxi e o taxista disse para ela: Quem foi que lhe fez isso? Como se ela tivesse sido estuprada e não tivesse escolhido a gravidez como todo mundo. Como se a mulher deficiente não tivesse sexualidade e não fosse fértil.
Folha - E para quem já nasce com uma deficiência? Puhlmann - Quem cresce com deficiência, às vezes, nem se vê como portador de deficiência, não enxerga o preconceito. A pessoa cresceu com aquele mimo, aquela superproteção, é ingênua, não tem malícia e acaba até tendo dificuldades na área da sexualidade.
Folha - Como fazer "renascer" essa sexualidade? Puhlmann - Um dos aspectos mais importantes da sexualidade é a sedução. Como se seduz alguém? É como um felino com sua caça, focaliza-se o outro sabendo das fragilidades e potencialidades. Quando se seduz, o que se deseja é uma troca afetiva, mas você precisa saber quais são as suas forças. Se alguém acha que não tem força nenhuma, nenhum poder de sedução porque é deficiente, se a cadeira de rodas é um peso enorme, o outro sempre vai vê-lo no papel de amigo. É difícil para a pessoa que não tem deficiência se envolver, é um horizonte novo. Ela tem ansiedades, medo, resistências. Se o deficiente sabe disso, ele consegue facilitar para o outro. Se ele consegue se relacionar no meio social, se sai, se tem amigos, a chance de ele conseguir ter uma parceria é muito grande.
Folha - Quais são os caminhos para redescobrir o corpo? Puhlmann - Pensando em uma pessoa que ficou deficiente, é preciso redescobrir o corpo como um todo. Há várias formas. A principal é se tocar de novo, ver as áreas sensíveis, erógenas. Explorar a sensibilidade como um todo. Imagine uma pessoa que sentia seu corpo inteiro e de repente pára de sentir. Também é preciso usar recursos para flexibilizar os valores porque é preciso inverter o jeito que se via as coisas. Se o deficiente é muito "quadrado", é preciso torná-lo mais maleável, por exemplo, com cursos de dança inclusiva, nos quais as pessoas são tocadas, desenvolvem a sensibilidade, ou com a ida a sex shops. O deficiente vai a uma loja dessas e vê o que as pessoas compram, como brinquedos de masturbação, camisinhas com extensão de pênis. Isso faz com que ele comece a ver o sexo de forma mais solta, com mais humor.
Fabiano Puhlmann, é autor do livro "A Revolução Sexual sobre Rodas" e membro da Sociedade Brasileira de Sexologia Humana.
Um comentário:
Excelente entrevista! Muito motivadora e esclarecedora.
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